Entrevista a Xiskya Valladares Paguaga, uma religiosa ”tuiteira”
Roma, 29 de Janeiro de 2013 (Zenit.org). Rocío Lancho García
“Foi mais ou menos há 2 anos que descobri a existência de três elementos inseparáveis na minha vida: o jornal diário, a máquina fotográfica e a Bíblia. Não concebo uma espiritualidade abstracta que não se encarne na realidade do mundo hodierno. Por isso considero necessário estar ao par da atualidade. E nem sequer entendo essa mesma atualidade sem a fotografia que a imortaliza. Porém, não estou a falar da fotografia documental, mas sim de todo o tipo de imagem que exprime realidades que na maioria dos casos não se podem narrar com as palavras. Finalmente, isso seria inútil sem a Palavra de Deus que dá sentido a tudo e sem o podermos partilhar pessoal e virtualmente”. É assim que se apresenta na sua página web Xiskya Valladares Paguaga, uma religiosa da congregação Pureza de Maria, que vive em Palma de Maiorca, Espanha, filóloga e jornalista, uma religiosa ativa e empenhada na evangelização através das redes sociais.
Como é que nasceu em si esta curiosidade, interesse pelas redes sociais?
Xiskya Valladares: Quando surgiu o movimento de 15M [movimento chamado assim pelo 15 de Maio, ou seja dos “indignados”, surgido em Espanha nessa mesma data, com acampamentos na Porta do Sol de Madrid e de outras praças, de organizações citadinas cujo lema comum era democracia real e já] interessava-me acompanhar de perto as suas mensagens para contrastar a informação que aparecia nos jornais com que eles mesmos transmitiam através do Twitter. Tenha em consideração que uma das minhas competências ou profissão é aquela do jornalismo. A partir daí dei-me conta da surpresa que provocava em muita gente o facto de encontrar uma religiosa, de hábito, nas redes sociais. Alguns pensavam que era um perfil falso e naquele momento tive que dar várias explicações e demonstrações de que era autêntica. Porém, o que despertou a minha vocação para evangelizar através das e nas redes foi a JMJ de Madrid 2011, visto que muitas pessoas me agradeciam para que lhes enviasse mensagens em tempo real com o twitter. Aí descobri a grande potencialidade que este meio constitui para a missão evangélica.
O papa dedicou uma mensagem à Jornada Mundial das Comunicações precisamente às redes sociais. O que é que lhe pareceu dessa mensagem?
Xiskya Valladares: Gostei muito porque coincide exatamente com muitas das ideias que também já começamos a reflectir sobre elas na iMisión. É uma mensagem atual, aberta, profunda e que pode encorajar muitos religiosos a subir para o carro da evangelização através das redes sociais. Por isso resulta-me surpreendente que muitos meios de comunicação generalistas em Espanha não tenham comentado nada sobre esta mensagem, quando é tão moderna e cheia de esperança.
Como é que se comunica a mensagem de Cristo através das redes sociais?
Xiskya Valladares: Creio que em primeiro lugar se trata de uma forma de estar e de nos relacionarmos. O próprio papa disse-o bem claro na sua chamada de atenção para viver a autenticidade. E se somos autênticos, teremos que transmitir os valores do Evangelho, mesmo quando recebamos insultos ou ridicularizações pela nossa fé. É a oportunidade de viver esse dar a outra face a que Jesus nos chama, sem deixarmos de ser claros e decisivos sobre os princípios fundamentais da doutrina. Em segundo lugar, penso que devemos dar testemunho de comunhão entre nós, com a Igreja e com o seu Magistério. Que todos sejam um, disse Jesus, para que o mundo acredite… Em terceiro lugar, acolher e consolar todos aqueles que nos pedem orações, para rezarmos por eles, pedem aconselhamento para os seus problemas ou se aproximam de nós feridos por algum motivo. Por isso, necessitamos de escutar muito, responder pessoalmente, e transmitir mensagens de esperança. Em suma, a vida real levada até à virtual, assim como nos foi pedido pelo papa na sua mensagem.
Há pouco mais de um mês que o papa abriu a sua conta no Twitter, isso tem sido um estímulo para que os religiosos sejam mais activos na rede social?
Xiskya Valladares: Penso que sim. Que há um despertar para o sexto continente, o digital. E que o papa nos está a dar o exemplo, não são só teorias. Isso é importante. Antes, qualquer pessoa me podia interrogar, o que é que faz uma religiosa metida nas redes sociais, como se isso fosse incompatível com a minha vocação; agora ninguém me interpela, porque até o próprio papa está no Twitter. De facto, na iMisión continuamos a receber pedidos para a realização de cursos, para pessoas da Igreja que estão mais interessadas por este tipo de evangelização. E, isto parece-me muito importante. Como diz o próprio papa na sua carta, nas redes estão presentes todas as inquietudes e desejos do coração de cada ser humano. E a Igreja deve estar presente. Nós somos Igreja. Temos algo de muito importante para transmitir como resposta a todas essas inquietudes e desejos do coração humano. Aprendendo ao mesmo tempo e com muita humildade dos outros, porém não podemos guardar exclusivamente para nós o tesouro que recebemos como dom: o próprio Cristo e a sua mensagem.
Que vantagens oferecem as redes sociais para a nova evangelização?
Xiskya Valladares: Permitem-nos escutar o lamento do nosso mundo de hoje, permitem-nos dar uma resposta a esse lamento; ajudam-nos a chegar onde nunca teríamos chegado através dos meios tradicionais; permitem-nos unirmo-nos na missão; ajudam-nos a rezar por um maior número de pessoas; põem-nos em movimento para dar as respostas mais criativas às necessidades pastorais que somos capazes de captar; ensinam-nos a trabalhar em equipa e a criar sinergias dentro da mesma Igreja. E que tudo isso dê o seu fruto graças ao Espírito Santo que atua em cada um de nós. Por outro lado, de forma mais pessoal, ajudam-nos a viver com mais humildade mesmo quando nos insultam ou quando contemplamos as situações difíceis nas quais vivem muitas pessoas, ajudam-nos a sermos mais agradecidos pelos dons recebidos.
Já mencionou pelo menos duas vezes o projecto #iMisión. Poderia contar-nos de que se trata?
Xiskya Valladares: Trata-se de uma rede de missionários do sexto continente, o que nós acabamos por chamar iMisioneros. Uma manhã de Junho o H. Daniel Pajuelo, @smdani, e eu tivemos uma conversa em que partilhamos uma série de preocupações sobre a temática da evangelização na Internet. Dessa conversa nasceu iMisión. Nesse mesmo Verão, tanto ele como eu nos dedicamos à reflexão e à oração pelo projeto. Quando retomamos o curso no mês de setembro convidamos outras pessoas para que também elas fizessem parte da equipa que coordenava o projeto. Desde então, temos vindo a realizar uma série de iniciativas nas quais queremos envolver todos os que se identificam e unem ao projecto como colaboradores. A mais importante foi a de iEvangelizar da qual nasceu o nosso Decálogo que é a base teórica daquilo que significa para nós evangelizar na Internet, ou seja, que é a mesmo coisa: ser iMisionero. O mais importante para nós é criar uma rede internacional de iMisioneros no mundo que falem a língua espanhola, oferecer e receber formação no âmbito deste tema técnico e sobretudo da evangelização na Internet e organizar um congresso de iMisioneros que seja a semente de um novo vigor evangélico na rede.
9.844 [hoje, 08|fev|13, 10.117] Followers [seguidores] atualmente no seu perfil. Quando iniciou, pensava que isso seria possível?
Xiskya Valladares: O que é que será! Nunca pensei que poderia chegar a estes números. De facto quando cheguei a mil seguidores já me pareciam muitíssimos. Pensava comigo mesma o que é que pode interessar ao mundo tuiteiro aquilo que uma freira tem para dizer?. Porém, creio que as pessoas agradecem a nossa presença, pelo menos dizem-me que é uma maneira de nos sentirmos mais próximos e quem nos dera que muitas outras religiosas se enchessem de coragem para isso.
Que dificuldade encontrou no seu trabalho como ‘tuiteira’?
Xiskya Valladares: A primeira dificuldade com que me deparei foi a dos ‘trolls’, houve uma época em que não me deixavam em paz. Durante uma semana recebi só em quatro dias mais de 50 tuits diários ofensivos. Porém os ‘trolls‘ abandonam quando tu não os alimentas ou quando as tuas respostas não entram no jogo deles. Há bastante tempo que me deixaram em paz, à parte algumas excepções esporádicas.
A segunda dificuldade é o tempo, tendo em conta que gosto de responder pessoalmente a todas as interpelações. Até que te organizas melhor, aprendes ferramentas úteis que facilitam o trabalho, e que de alguma maneira com o Twitter incorporas na tua rotina.
A terceira dificuldade é a luta diária que tens que ter contigo mesma para aprender que os elogios não te devem exaltar, inchar, nem os insultos te devem derrubar ou afundar. Para isso é fundamental a oração e o apoio da equipa. Nunca nos podemos esquecer que somos servos inúteis…
Como é o dia-a-dia de uma religiosa ‘tuiteira’? Como o concilia com as outras suas obrigações?
Xiskya Valladares: Agora mesmo com muitíssima organização. Tenho que dar aulas numa universidade, escrever para alguns meios e revistas, sou diretora da revista Mater Puríssima, tenho que coordenar uma sala de imprensa, de comunicação, preparar as conferências que me pedem, trabalhar na minha tese de mestrado e fazer a vida comunitária com todos os compromissos que isso implica, de reuniões, oração, excursões, etc. Twitter levo-o no telemóvel por isso escrevo quase sempre enquanto caminho pelos passeios, e tenho sobretudo dois momentos ao dia em que dedico meia hora para responder; além disso, para os tuites que não são pessoais utilizo algumas programas com as quais programo o seu envio automático. Para as outras coisas costumo dedicar dois dias por semana para a tese e as publicações, umas horas para a sala de imprensa e a revista, e o resto para preparar as lições, corrigir os testes, etc. Como te dizia, é necessário ter muita organização e tens que calcular muito bem o teu tempo.
A Xiskya Valladares podem segui-la em @xiskya.
(29 de Janeiro de 2013) © Innovative Media Inc.
Tradução de Domingos Ribeiro da Costa